CÉSIO 137 - O PESADELO DE GOIÂNIA (1990)

Direção: Roberto Pires
Descrição da imagem 1



O acidente do Césio-137 é um tema recorrente no cinema goiano, e este longa de Roberto Pires é o que inaugura essa filmografia, com ares de história oficial sobre a tragédia. Apesar do interesse natural associado ao acidente e o elenco de atores famosos, o filme hoje segue relegado à exibições sonolentas em escolas e cópias detonadas ou de restaurações duvidosas no Youtube. Sensação de um longa esquecido apesar do nome dos envolvidos, da relevância do caso e de ser a única ficção a propor contar fielmente a história.


Acontece que este se debruça exageradamente sobre o cotidiano da família dos moradores do ferro-velho e demais pessoas que por ali transitavam, fascinados com a luz emitida pela peça que contém o césio e displicentes com o adoecimento crescente que sofrem. Roberto Pires repete as situações de deslumbramento com a luz, de recusa a ir ao médico, das mulheres ressabiadas com o artefato e os homens que se recusam a ouvi-las. Cenas repetidas que só mudam os atores, compondo essa pequena sociedade de ignorantes. Ao menos a construção destes locais, o ferro-velho e a casa das famílias, tem uma fisicalidade autêntica e Roberto consegue criativamente manter atento o olhar para estes cenários. É mesmo palpável o calor que o filme expressa na pouca roupa de todos os homens, algo bem goiano.


Mas essa repetição acaba pesando na figura das vítimas como ignorantes que brincaram com o que não deviam, que foram negligentes. Repetem desculpas ingênuas para justificar o prolongamento da tragédia, ainda que visivelmente algo esteja errado (nunca tem médico em Goiânia, foi a coca-cola que fez mal). Gira em torno destas anedotas para passar o tempo, dentro e fora do filme, o que reforça a sensação de final abrupto. Quando finalmente descobrem ser o césio ele logo acaba, no meio da história, negando todo o imaginário da radioatividade que assombra esse conto de horror. Os homens com aquelas roupas futuristas, o banho de mangueira, a destruição de tudo que um dia pertenceu a estas pessoas, o enterro em caixão de chumbo. Tal como Joelma 23º Andar, de Clery Cunha, outro filme feito na ressaca de uma grande tragédia brasileira, Césio-137 é mais feliz quando flerta com o cinema de horror, na presença de uma trilha sonora mórbida e no fantástico da luz azul que banha os cômodos. O sentimento de morte atravessa o filme todo e é mesmo desconfortável ver estas pessoas lentamente sucumbindo, mas o alívio nunca acontece.


Outros importantes filme sobre o Césio-137 viriam apenas no começo dos anos 2000. Césius 13.7, de Beto Leão; e Césio 137 - O Brilho da Morte, de Luiz Eduardo Jorge. Realizados por goianos, ambos fazem esse movimento de busca da verdade das vítimas, trazendo seus depoimentos e denunciando a violência a que foram submetidas pelo Estado. Ampliando a tragédia do césio para além do escopo menor deste filme, os curiosos dias que estas pessoas passaram com as pedras. Trazendo a autoridade das vozes que contam essa história para as vítimas, para além de suas condições sociais e de seu desconhecimento da radioatividade.

Autor: Luciano Evangelista