A desocupação do Parque Oeste é uma pauta presente no cinema goiano desde que a violência ocorreu, em 2005. Já em 2007, Rapsódia do Absurdo, de Cláudia Nunes, trataria do assunto pela seara do cinema experimental, construindo um filme que emula o atropelo psicológico sentido pelas pessoas que estavam na ocupação no momento da invasão da polícia militar, constituído majoritariamente por imagens captadas no olho do furacão. Sonho Real - Uma História de Luta por Moradia, de 2010, do Centro de Mídias Independente, é um longa documentário tradicional, abundante em informação, com depoimentos de pessoas envolvidas e o resgate de notícias e documentos da época, visando dar um panorama geral de todo o processo de ocupação, depois a desocupação e por fim as batalhas jurídicas que sucederam. Em 2012, A Luta Continua 2, do Movimento do Vídeo Popular, traria também em formato jornalístico uma atualização da história a partir da criação do bairro Real Conquista em 2011, centrado na participação das mulheres neste processo. Neste último, Eronildes também aparece como uma das personagens que narram o acontecido. Ela, que viria a ser a protagonista do curta Real Conquista, de Fabiana Assis, de 2017; e posteriormente do longa que é um desdobramento dele, este Parque Oeste.
Trata-se portanto de uma história de presença recorrente nos festivais e mostras de cinema daqui, repleta de imagens intensas, cuja organização e rememoração se entrelaça com a luta dos envolvidos pela moradia. Imagens muitas vezes organizadas com o fim de denunciar a violência assassina da polícia e a violência jurídica que veio justificar e absolver o Estado. Todos estes filmes devem muito ao estadunidense Bradley Will, ativista responsável pelos registros mais intensos da violência policial, que estava ali ao lado das famílias nas noites antes e no momento da desocupação. Suas imagens imprimem uma realidade de guerra, de medo e tensão sufocantes, e não à toa são o clímax de Parque Oeste.
O longa de Fabiana chega então após outras tantas abordagens já realizadas sobre o Parque Oeste que se debruçam sobre as mesmas imagens incríveis de Brad. Ela traz de novidade a abordagem do documentário brasileiro contemporâneo, que despe-se da obrigação de enunciar definitivamente os fatos para se colocar junto do cotidiano das personagens e ir então rememorando a história aos poucos. Mais conversa e menos depoimento. O filme a princípio se junta a Eronildes para, em uma ida até o Parque Oeste, acessar as memórias dela da ocupação e também a memória registrada em arquivo. Constrói uma narrativa de cerco com clímax violento e desfecho derrotista. É um resumo da história a partir da fala de Eronildes e as imagens da desocupação, sem ambições totalizantes, sem os dados burocráticos gerados.
Parque Oeste opta por contar esta história sob o viés da luta vitoriosa, longe do tom amargo e de denúncia de todos os outros filmes já feitos sobre a história. Eronildes torna-se protagonista que abre sua casa, sua intimidade familiar, suas lembranças amorosas, indo além da sua condição de líder do movimento por moradia. É um gesto que se distancia dos pormenores da luta, focando no cotidiano da personagem e do bairro num pós-guerra. Tempo de reconstrução, de homenagens, de colecionar memórias. Toda sua segunda metade ganha ares de epílogo alongado. As cenas são construídas em torno dos temas do documentário (as ruas, as obras, a convivência com outros moradores, a organização das mulheres), o que se por um lado adensa o filme em torno de uma galáxia de imagens que rimam, que se conectam imediatamente; por outro não permitem que o filme cresça para além destes temas e torne a aproximação entre cinema e história/personagem mais do que um projeto de documentário, um encontro de fato orgânico, autêntico. O filme cumpre o esperado de um projeto de longa-metragem sobre o tema, sem maiores surpresas, para o bem ou para o mal.