"Taego Ãwa" é um interessante e raro exemplo de como o cinema documental pode desafiar as suas próprias convenções tradicionais e transformar materiais brutos em uma obra artística envolvente e reflexiva. Ao invés de simplesmente se apoiar na estrutura convencional do documentário clássico, que muitas vezes visa apenas apresentar o contexto e o conteúdo em detrimento da forma artística, este filme inova ao resgatar imagens e as recontextualizar em uma narrativa impactante.
Os diretores Henrique Borela e Marcela Borela descobriram cinco fitas VHS arquivadas em uma universidade, contendo registros do cotidiano da tribo indígena Ãwa. Estas fitas, que mostravam cenas simples e cotidianas dos Ãwa (como caçadas, rituais de pintura corporal e preparo de alimentos), muitas vezes granuladas e desbotadas, são habilmente entrelaçadas com registros recentes feitos pelos cineastas. Apesar das diferenças visíveis na qualidade das imagens, o filme constrói um fluxo imersivo, que não apenas documenta a sobrevivência física dos Ãwa, mas também celebra a resistência cultural desse povo diante das adversidades impostas pelos colonizadores desde a década de 70.
A montagem aparentemente caótica é uma ferramenta deliberada para desafiar a linearidade da narrativa documental tradicional. As cenas de atividades diárias dos Ãwa se entrelaçam com momentos de confronto político, destacando a invasão de suas terras e suas lutas por demarcação, mas tornam o ritmo do filme irregular, com cenas que às vezes se alongam além do preciso, enquanto outras são encerradas de forma abrupta.
"Taego Ãwa" é um longa que, dadas as devidas proporções, tenta transcender aos poucos as restrições do gênero documental tradicional, ainda seguindo um molde informativo. Mesmo com suas limitações de produção, o filme chama a atenção para a urgência de dar voz a povos indígenas cuja existência continua a ser ameaçada. É um dos poucos e raros que não simplesmente documenta, mas também se posiciona como uma voz de resistência.