"As Duas Irenes" é um filme que, à primeira vista, parece mergulhar nas complexas questões psicológicas que surgem quando uma adolescente descobre a existência de outra "Irene": uma irmã filha de uma segunda família de seu pai. No entanto, ao longo da narrativa, o longa acaba por seguir um caminho mais convencional, focando-se nas experiências típicas da transição para a fase adulta, ao invés de explorar mais a fundo as nuances e as perversidades do conflito que se apresenta.
A trama começa com Irene, uma jovem no limiar da adolescência, tentando lidar com as pressões de ser a filha do meio em uma família tradicional e rígida. Ela se vê dividida entre a indiferença que sente dos pais, que concentram suas atenções na irmã mais velha, prestes a debutar, e na caçula, que ainda necessita de cuidados constantes. A situação se complica ainda mais quando Irene descobre a segunda família de seu pai, composta por outra esposa e uma filha da mesma idade, também chamada Irene. A partir daí, o filme nos apresenta uma Irene 2 que, diferentemente da protagonista, não é invisível para o mundo ao seu redor; sendo muito mais segura de si mesma.
A premissa poderia ter levado a uma profunda reflexão sobre identidade, hipocrisia e as intrincadas dinâmicas familiares em uma pequena comunidade. No entanto, o filme escolhe não se aprofundar nesses temas, preferindo se concentrar nos elementos típicos de uma história de amadurecimento. As questões sobre como essas duas jovens, que rapidamente se tornam amigas, enfrentam a vida adulta, o machismo e as pressões sociais, são apenas superficialmente abordadas. Em vez disso, a narrativa foca nos primeiros amores, nas mudanças físicas e na descoberta de segredos familiares.
Apesar dessas escolhas narrativas, "As Duas Irenes" brilha em sua construção de personagens. Priscila Bittencourt e Isabela Torres entregam performances autênticas, capturando as angústias e incertezas da juventude com uma naturalidade cativante. A interação entre as duas é um dos pontos altos do filme, especialmente nas cenas mais sutis e introspectivas, como os passeios de bicicleta e os momentos de descontração, que humanizam e dão profundidade às protagonistas.
Visualmente, o filme adota uma estética simples e precisa, com enquadramentos e iluminação cuidadosamente pensados para reforçar a sensação de um mundo controlado e monitorado, refletindo a vida na pequena comunidade em que a história se desenrola.
"As Duas Irenes" se destaca pela sua sutileza e pela forma como aborda temas universais de maneira acessível, em especial, a delicadeza com que retrata a jornada de autodescoberta dessas jovens. Embora o filme não explore completamente todas as implicações de sua premissa, oferece uma experiência cinematográfica envolvente, desnudando as complexas dinâmicas familiares que muitas vezes se escondem sob a superfície da aparente normalidade.